terça-feira, 20 de abril de 2010


Assembléia Ratolina
Thiago Allexander

Logo após por os pés na calçada e se dirigir à rua na intenção de atravessá-la, avistei Augusto de braços abertos a me cumprimentar, seu sorriso maroto já me fez entender que havia algo de muito bom acontecendo. Saudosamente nos falamos e disse que tinha uns cartazes antigos de circo na casa dele pra me presentear. Fomos em direção a sua residência, atravessamos a rua juntos, uns vinte passos, chegamos. Entrou pegou o cartaz, me entregou e contou como tinha os conseguido. Tomamos um chazinho delicioso que ele preparou e ficamos num papo tranqüilo e descontraído debaixo do pé de manga. Tudo e tranqüilo e sereno, as crianças brincavam silenciosas e entretidas. Enfumaçamos os céus com nossos pensamentos e após uns vinte minutos aproximadamente o telefone do Augustinho tocou. Conversou pouco e sucinto e combinou que já ia lá. Preparei pra levantar e partir, no que ele me interpelou de imediato pra ficar e esperar mais uma dose de chá e disse ser rápido o processo que ia fazer. Fiquei sentado sob a sombra da mangueira a refletir a vida com os olhos vagos. De repente Larissa grita bem perto de mim ‘olha o rato, o rato, o rato!’. Quando me virei e olhei o roedor correu e se escondeu entre uns entulhos. O gato saltou e foi averiguar a situação. No mesmo pulo que foi ele voltou pra de trás das minhas pernas correndo. Apanhei uma pedra enorme de concreto com uma banda de tijolo incrustada e me preparei pra massacrar o visitante inoportuno. Não que eu seja contra os animais ou roedores, é pelo fato como são abusivos e evasivos esses ratos urbanos. Quando consegui avista-lo entre as pedras e restos de um armário velho, percebi o por que do gato ter ficado com medo, era uma ratazana enorme quase do tamanho do gato. Joguei o tijolo com força e precisão, ele bateu na parede uns quarenta centímetros do rato, que correu e entrou num cano e sumiu. Minha má pontaria tinha feito um buraco na parede de uns dez centímetros mais ou menos. Curioso que sou, me aproximei e tive a visão mais fantástica da minha vida, quiçá de toda a humanidade. Vi uma centena de ratos alinhados em fileiras quietos escutando atentamente um outro ratão que discursava eufórico e eloqüente. Reparei que todos seguravam uma espécie de papel, nas patas superiores. Era uma Assembléia Geral, uma sessão ordinária que tinha como temática de sempre, conquistar o mundo e mandar os seres humanos para os esgotos e submundos. Dentre as propostas traçavam uma invasão conjunta em todos os centros de poder nacional e mundial e citavam seres humanos como cúmplices e parceiros. A estratégia vinha sendo preparada por uma equipe de ratos do centro de estratégia que ficava na Rússia. A articulação era tão minuciosa que pelo que entendi estava sendo desenvolvida há quarenta anos. Envolvia o corte de água, o saque de alimentos e até assassinatos de autoridades e seqüestros. Percebendo o tamanho da organização e acreditando eu no risco da humanidade, resolvi chamar alguém e por fim pelo menos naqueles congressistas. Apoiei minhas mãos na parede na intenção de me afastar e pá. Algo ou alguma coisa me atingiu a cabeça forte e eu apaguei. A primeira coisa que vi logo após abrir os olhos foi a carinha da Larissa e seus cabelos ruivos esvoaçados bem próximos de meu rosto. Senti alguns pontos doloridos nas minhas costas e percebi que estava deitado entre os mesmos entulhos onde outrora o rato se escondera antes. Quando me sentei, pude ouvir novamente o barulho das coisas, os ônibus passando e estremecendo tudo. Do portão Larissa conta o fato ao pai que vinha chegando de uma maneira bem interessante e infantil dizendo que eu estava dormindo. Nisso levantei rápido e olhei o buraco, não estava lá, havia sumido, mas como? Esses ratos, esses ratos, são mesmo uns ratos,pensei. Ao ver Augusto, ainda meio tonto, sentei de novo em baixo do pé de manga e decidi não contar o fato esquisito que vivenciei. Tomei mais chá, bati mais uma meia hora de papo e fui embora. Já na porta de casa decido ir ao supermercado. Pensei tenho que me prevenir. Comprei todo estoque de veneno pra rato, cerquei toda minha casa num ritual detalhista fiz uma cobertura completa em volta do telhado, entre as cômodas, em baixo, em cima e por toda parte. Ainda não descobri o que me acertou, ando espiando desconfiado tudo quanto é buraco e sempre a impressão de estar sendo observado, mas é incrível demais pra alguém acreditar nessa historia. Preciso de provas e vou consegui-las primeiro, enquanto isso, fico atento.