quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Ser Folha ou Não Ser

A natureza é fantástica com sua força seus mistérios. Pois bem. Os processos de transformações, as mutações e a violência humana causam situações horrorosas e drásticas. De uma arvore dessas que viram papel sobro justamente numa folha branca de papel no formato A4 o sentimento de injustiça e revolta. A folha exprimida entre tantas sentia-se fatalmente ferida e constrangida em ter se tornado algo tão frágil e maleável. Nestas perguntas e exclamações decidi infectar com discursos emotivos todas as folhas da resma sua ideologia. Mas somente ela está viva e sente que está mesmo. Ao sair da embalagem que a envolvia a nossa arvore inconformada começa a fomentar uma maneira de se rebelar e buscar um jeito de se safar das tintas e das palavras que eram sua sina ali na impressora. Esse surpreendente fato de uma folha de papel com tanto sentimento ultrapassa com certeza a compreensão humana da realidade e no entanto se iguala completamente a tantas situações que chamamos acidentes, milagres, fé e etc. A folha vendo que já chegava sua hora de ser impressa. Avistou longe a janela e usando uma antiga linguagem vegetal pronunciou um pedido de socorro ao vento, que prontamente atendeu e inundou a sala uma ventania providencial. Nossa folha persistente conseguiu surfar no ar entre as mãos burocratas e se mandar pela janela. Em pleno ar pensou como seria fácil bater asas se tivesse uma dobra no meio. Sem a dobra seu voou durou pouco e ela foi se emaranhar justamente nos galhos de uma arvore. Como foi agradável estar ali de novo entre o verde das folhas o marrom dos galhos o vento agitando tudo num balé eterno. Durou pouco essa sensação, pois o mesmo vento a soprou de novo e ela foi ao chão. Era umas três horas da tarde, o asfalto quente castigou a folhinha rebelde e ela si pensava seu destino que ia de mal a pior, a possibilidade de alguém lhe pisar, rasgar ou ser apanhada pelo caminhão de lixo. Nada aconteceu a tarde inteira. O sol, o céu, os pássaros, as pessoas criaram um novo significado ali de baixo grudada ao chão como estava. Refletiu sobre o destino, sobre Deus, os homens suas invenções e suas mentiras e acabou por concluir já ter ido longe demais com seu inconformismo e acabou por perceber sua importância lá na impressora, como as letras que lhe seriam impressas poderiam lhe dar outro sentido e como seria ter os olhos de alguém deslizando na sua superfície e decifrando as palavras. Chamou o vento novamente dizendo querer voltar pra onde estava, o Vento lhe explicou não ser possível a janela estava fechada, alem do mais folha suja e amassada não tem utilidade. Contrariada a folhinha decide ficar mais relaxada e deixar se levar por aí. Haviam passado muitas pessoas por ali, carros, cachorros e crianças, mas ninguém chamou atenção tanto como um rapaz moreno, alto, roupa social, ele havia tocado o interfone varias vezes sem atendido, sentava no meio fio desconsolado, voltava, apertava mais a campainha, andava em círculos, parava pensativo, gritava um nome, apertava de novo em desespero. A Folha curiosa deixa chegar mais perto dele passeando com a brisa. Ele a vê cambaleando e a apanha com cara de quem teve uma grande idéia. Ao ser apanhada nossa Heroína caiu em confusão e desespero, pensa todo tipo de impropérios. O rapaz tira do bolso da camisa uma caneta e começa a escrever. A Folha se delicia com o riscar suave da ponta da caneta em sua superfície e as palavras escritas a emocionaram tanto a ponto de estancar todo medo sentido a pouco. O Jovem apaixonado escreveu o seu mais profundo sentimento e deixou na caixinha de correio nossa Folha Guerreira. O escuro confortou-a dentro da caixinha e quando acordou já desdobrada, sentiu a umidade salgada que lhe escorria em vertical. Uma moça linda com os olhos vidrados chorava alegremente enquanto lia os versos que aquele rapaz ontem escreveu. Tudo soou tão romântico e fantástico que se esqueceu de todos os argumentos contra ser uma Folha e aceitou sua sina com toda convicção de que não haveria nada melhor pra lhe acontecer. Ganhou lugar eterno num coração e companhia dentro de um livro com folhas amarelas e brilhantes, que vez ou outra são lidas e acariciadas com ternura.

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